A idéia para a semana era óbvia como uma equação matemática: falar sobre a independência na semana da independência, onde todos fogem dos desfiles e tudo mais, mas aproveitam o feriado, é claro. Mas difícil foi fazer a escolha, se alegrar com ela, depois de mudar mil vezes e chegar numa escolha nada prevista, porém aceita, devido ao apressar da carruagem: “Notícias Populares”, da Ana Carolina e “Panis et Circenses”, dos Mutantes ilustres na música brasileira, Caetano e Gil.
Ok. Músicas escolhidas. Ops...Mas e a idéia da Independência? Quá. Acho que foi pro brejo, como o nosso país e o respeito que deveríamos ter por ele, em unanimidade, não só em minorias em extinção.
Panis et circenses, ou no melhor, curto e grosso português: Pão e circo. Que é o que os governantes do nosso país nos oferecem como recompensa e atrativo por termos usado nosso poder de mudança pra votar em quem continua a fazer o mesmo que foi feito até agora – porcaria nenhuma. Mas isso não vem ao caso, parabéns pra nós, os donos do poder em uso inadequado. É por isso que devemos ler os manuais de instruções, eles sempre explicam os problemas decorrentes, está tudo ali, compre se quiser.
Ana fala de Notícias Populares, aquilo que atrai o povo – Pão e circo, lógico. Comer porcarias e rir de besteiras, ou vice-versa. É o que a alienação nos permite querer, numa era onde se idolatra o sensacionalismo e nos importamos mais com as crises internacionais (quando pensamos em nos preocupar com alguma causa) do que com a nossa própria desgraça. Mas quem vai querer se importar com a pobreza tirando o seu sarro? O meu vidro já está todo blindado.
Podemos até esquecer a crise da Argentina, mas lá pelas Globos, Bands e Records da vida, temos notícias sobre o Onze de setembro e o Iraque aparecendo até nas TVs das lanchonetes. E quem procura saber se a água se acaba, e se há mendigas descabeladas dormindo na vertical em épocas onde o Código da Vinci ( ou código da Venda) é tão popular quanto os Nikes, bikes, Cocas lights e canivetes do camelô em cheques pré-datados que não estipulam datas para finalizar a nossa miséria material e intelectual? No dia
Os mutantes terráqueos falam das pessoas da sala de jantar. Essas pessoas da sala de jantar. São as pessoas da sala de jantar. Que só estão preocupadas em nascer e morrer, nada que aconteça nesse mero intervalo de tempo chamado vida. Não se importando com as canções cantadas iluminadas de sol, tampouco com os panos soltos sobre os mastros no ar e os tigres e leões soltos no quintal.
Enquanto estivermos mergulhados nessa inércia mental que nos faz sermos essas pessoas na sala de jantar encenando papéis decorados, preocupados somente em nascer e morrer, as notícias populares vão continuar voando pelos ares e ninguém sabe se alguém recua ou se alguém invade. Se alguém tem nome ou se alguém tem fome, pois tanta gente vive só com o que dá pra aproveitar. E não adianta plantar folhas de sonho no jardim do solar, pois as folhas sabem procurar pelo sol, mas nós não sabemos procurar por nós mesmos. É querer demais procurar um ideal, um sonho e uma independência que nunca virá enquanto formos dependentes de cenários pré-montados com desfechos programados em falsos finais felizes com aplausos de pé. Pão e circo cansa, e é pra controlar marionetes, felizes com um cantinho pra deitar e uma bola pra acalmar. Mesmo que seja tudo forjado. Mesmo que seja tudo bossal. Mesmo que seja tudo absurdo. ‘Tudo errado, mas tudo bem...”
Eu furo os planos, eu furo o dedo, “mando vê”, aperto o passo, eu não sou louca. É que tomei um tiro no vidro do meu carro. E quando a pobreza leva meu dinheiro e meu livro caro, deixo que façam bom proveito da grana que roubaram, porque eu trabalho e outro dinheiro eu vou ganhar. Pra que me importar então? Vou ser só mais uma pessoa no ilustre banquete na sala de jantar, apenas preocupada em nascer e morrer, porque o resto exige potencial de mudança demais, e isso pode dar indigestão, nada pode estragar a festa na sala de jantar.
Mandei fazer de puro aço luminoso punhal para matar o meu amor e matei, às cinco horas na avenida central. E ninguém se chocou, afinal, tudo se acaba, olha o noticiário. Como a vida de alguém se acaba antes do final? São as pessoas da sala de jantar. Mas as pessoas da sala de jantar. São ocupadas em nascer e morrer. Independência? Não, não sei o que é...Me dá mais pão? O espetáculo vai começar. Sem segundo turno, espero.
By Mônica
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2 comentários:
O negócio é que falar de Independência no Brasil é meio tenso... nós somos independentes no 7 de setembro, que bom, mas... e daí? Um país com tantos problemas como esse não deve ser idolatrado num feriado só pq somos independentes "politicamente".
Esse texto é maravilhoso. Panis et Circenses foi uma música muito feliz pra ser escolhida nessa época.
Só um detalhe: tenho amigos que passam o dia ouvindo Velvet Underground, passam o dia discutindo os problemas do país, mas, na prática, não fazem nada.
Adoro esse país.
Beijos, amo você, mamis. :*
Pão e circo, é isso que o povo gosta, desde a época do império romano e nada mudou até hoje. Não somos os únicos que ficamos satisfeitos com uma bola pra distrair.
Mais uma vez você está de parabéns, e desta vez enveredando para um lado seu que acho fantástico, que é o da crítica de forma menos lírica e mais forte. Você é uma excelente escritora em qualquer tema. Está de parabéns, amor!
Você é o texto que todos lêem, né?! (você entendo o que eu digo RS) E seu nível de qualidade continua impecável.
Te amo!
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